Quando era miúda tinha pesadelos em que imaginava que estava a dar de mamar. Estranho sonho esse que me perseguia e me provocava sensações de desconforto e estranheza. Grávida do meu primeiro filho prometi não pensar no assunto. E assim foi até ao instante em que, depois de nascer, o meu filho mais velho foi posto no meu peito com um gorro branco, ainda cheio de sangue. Foi, nesse mesmo instante que, depois de um parto normal e um ser minúsculo alapado à minha mama que lhe bastava para viver, que me consciencializei da minha condição: sou mamífera.
Não foi imediata a sintonia com este lado animal. Primeiro sufocou-me a ideia de ser essencial ao meu filho. Depois doeu-me. A seguir cansou-me. Fui, devagar, descobrindo o prazer daqueles instantes. Mas foi, confesso, uma descoberta solitária e quase envergonhada face aos comentários que me diziam que já chegava, que o menino estava viciado em mama, que não dormia por minha culpa. Descobri também que, esta coisa da maternidade, é plena de sentimentos de culpa e foram estes os primeiros a que cedi.
Passaram oito anos, o meu filho grande cresceu, fez-me um menino lindo e continuou a dormir mal mesmo comendo tudo, e eu aventurei-me a um segundo filho no estado civil solteira, desempregada, e com rumores que aí viria a maior crise de todos os tempos.
Mamífera consciente e feliz, ali estava, depois de parir o meu segundo filho de parto natural, com aquela criatura pequena alapada à minha mama. Mas desta vez não me enganavam, havia de bastar ao meu filho o tempo que os dois quiséssemos, havia de dar de mamar orgulhosa perante os olhares alheios, havia de aproveitar cada segundo deste momento de amor, deste prolongamento da criação, deste mimo infinito. E tornou-se o, agora, irmão mais velho o meu principal defensor.
Sou mãe e, nos entretantos disso, continuo a ser jornalista. Tenho 34 anos. Sou suburbana e mimada. Sou mamífera. É essa a minha essência.